sábado, 21 de novembro de 2009

Terra sem lei

Avança o processo colaborativo para a criação do marco regulatório da internet

Carlos Minuano

Avançam as discussões sobre o processo colaborativo para a criação do marco regulatório da internet, promovido pelo MJ (Ministério da Justiça) em parceria com a FGV (Faculdade Getúlio Vargas), do Rio de Janeiro. Nos primeiros 20 dias a consulta pública recebeu 433 comentários. O marco regulatório pretende definir regras de responsabilidade civil para provedores e usuários, mas resguardando direitos de internautas, como liberdade de expressão e privacidade. "Não faltam projetos de lei buscando regulação da web, mas todos ignoram direitos de internautas", diz Guilherme de Almeida, assessor da secretaria de assuntos estratégicos do MJ, presente no Seminário Internacional de Fórum de Cultura Digital, realizado em São Paulo, entre 18 e 21 de novembro.

A formulação do marco legal ocorre em paralelo a outros debates convergentes, como o da reforma da lei de copyright, o processo de elaboração de um plano nacional de banda larga e a Conferência Nacional de Comunicação, que será realizada em dezembro em Brasília, entre os dias 14 e 17, data de encerramento da consulta pública. "Começar o processo pelo debate com a sociedade é uma forma de reconhecer a pessoa que está por trás da rede, como um cidadão que têm direitos e deveres", prossegue Almeida.

Na primeira fase, a discussão ocorre a partir de proposta aberta na internet que abrange três categorias: direitos dos indivíduos, responsabilidade de intermediários e as diretrizes para a ação do governo. "Usuários podem fazer comentários e ainda avaliar as sugestões postadas", diz. Em questão, temas controversos como privacidade. De acordo com o assessor do MJ, uma proposta já rechaçada pela maioria foi a de atrelar IP a CPF.

Com algumas exceções, como Finlândia, EUA e França, poucos países possuem um marco regulatório para a internet. No caso brasileiro, Almeida considera positivo que apenas agora se esteja pensando no assunto. "Podemos observar erros dos outros e corrigi-los", afirma.

Concluída a primeira fase, o trabalho segue na direção da elaboração de um Projeto de Lei, que novamente ficará disponível na internet e, por fim, em meados do primeiro semestre, deverá seguir para o Congresso, onde não se sabe o que vai acontecer. Mas se não for aprovado até julho, com as eleições de 2010, o mais provável mesmo é que nada aconteça. O assessor do MJ explica que "buscar na sociedade a redação do PL é uma forma de tentar sensibilizar deputados para que o resultado deste debate não seja perdido".

Pelo estardalhaço que a recente lei Azeredo (que tipifica crimes na internet) provocou é de se imaginar que o novo PL acirre os ânimos em alguns decibéis, colocando em risco a cristalização da proposta em algo concreto. Mas, nem todos lamentam que isso ocorra. Para Claudio Prado, do Laboratório Brasileiro de Cultura Digital, melhor que processo não seja concluído para evitar a criação de regras equivocadas. "O que vale é a discussão", afirma. "Estamos atravessando um rito de passagem complexo, o digital cria uma horizontalidade para a qual instituições e sociedade de modo geral não estão preparadas".

"Para pensarmos a internet, precisamos abandonar os velhos paradigmas", observa Prado, "Em 2003, no início do governo Lula, estávamos ainda na pré-história do digital. Hoje vivemos um momento muito diferente, acabamos de derrotar uma tentativa da criminalização da internet, antes da criação de um marco legal".

A lacuna da falta de regulamentação, entretanto, tem provocado uma série de imbróglios jurídicos relacionados a divergências sobre direitos autorais e aos chamados cibercrimes, como o de pedofilia. "A atual política nacional de informática é de 1984, quando ainda sequer havia internet", lembra Guilherme de Almeida, do MJ.

"Crimes na internet precisam ser punidos, mas sem prejudicar espaço de criatividade", ressalta o secretário executivo do Ministério da Cultura, Alfredo Manevy. No entanto, acrescenta que o Estado não pode se omitir de sua responsabilidade em relação à segurança na internet.

As discussões sobre a criação do marco regulatório podem ser acompanhadas pelo Twitter e pelo site www.culturadigital.br/marcocivil.

Fonte: site da revista Brasileiros.

Nenhum comentário: